Por David Cronin, da IPS
Bruxelas, 4/6/2010 – A multinacional Coca-Cola, acusada de causar sérios danos à água e ao solo na Índia, pode aparecer agora como campeã da proteção ambiental. A União Europeia (UE) forneceu à empresa uma plataforma ideal para apresentar-se como ecologicamente progressista. O exercício de relações públicas realizado no dia 2 não deixou ninguém indiferente. Vários manifestantes interromperam Salvatore Gabola, um representante da Coca-Cola na Europa, quando começou a falar aos participantes da Semana Verde, uma conferência anual da UE que termina hoje em Bruxelas.
Carregando dois grandes cartazes com as cores vermelha e branca do logotipo do refrigerante, o grupo cantou músicas acusando a reunião dominada pelas corporações de “sujo lavado de verde”. Uma manifestante, que se identificou apenas com Anne, disse que este é o terceiro ano consecutivo que a Comissão Europeia – braço executivo da União Europeia – contrata a Amigos da Europa, “um grupo de especialistas patrocinado por empresas”, para organizar um dos principais debates da Semana Verde.
As empresas poluentes “não têm direito algum de influenciar o debate ambiental na Europa”, acrescentou Anne. No mês passado, várias organizações de ativistas escreveram à Comissão, protestando pelo fato de a Coca-Cola ser uma das patrocinadoras da Semana Verde.
Estas entidades, entre elas a Amigos da Terra, o India Resource Centre e o Corporate Europe Observatory, afirmaram que uma investigação determinada pelo Estado indiano de Kerala concluiu, em março, que a Coca-Cola havia esgotado o fornecimento hídrico local e contaminado a água e o solo. O comitê encarregado da investigação recomendou que a empresa seja multada em US$ 48 milhões pelas atividades de sua unidade engarrafadora na localidade de Plachimada, que fechou em 2004 após as objeções causadas por seu impacto sobre os recursos hídricos.
A Amigos da Europa, que organizou o evento, foi criada em 1999 e é financiada, em boa parte, por corporações. A entidade tem sede em Bruxelas e é dirigida por Giles Merritt, que trabalha como jornalista e lobista de companhias. Entre seus clientes mais controvertidos estão a fábrica de cigarros Philip Morris e vários fabricantes de armas. Como os acontecimentos que organiza costumam atrair altos funcionários e políticos, no ano passado o jornal Financial Times o incluiu na lista das 30 pessoas mais influentes sobre instituições da UE.
A decisão de envolver a Amigos da Europa na organização da Semana Verde aconteceu apesar de uma disputa com a Comissão Europeia. Merritt se negou a entrar em detalhes sobre suas atividades em um registro de lobistas criado por esse órgão, e insistiu que os grupos de especialistas (como define sua organização) não deveriam ser categorizados como entidades dedicadas ao lobby. Janez Potocnik, comissário europeu do Meio Ambiente, disse à IPS que não considera o boicote da Amigos da Europa contra o registro um motivo para “cessar a cooperação” com esse grupo.
Além da Coca-Cola a brasileira União da Indústria da Cana-de-açúcar (Unica) também patrocinou a Semana Verde. Os ecologistas consideraram muita ironia terem convidado a Unica para apresentar recomendações sobre como preservar a biodiversidade, quando promove as monoculturas no Brasil. Durante sua apresentação, Emmanuel Desplechin, da Unica, argumentou que no Brasil a cana-de-açúcar “é cultivada de modo a preservar a biodiversidade” e que “o crescimento econômico e o manejo ambiental podem seguir lado a lado”.
A Stora Enso, multinacional de celulose, foi outra participante da Semana Verde. Entre outras críticas, esta empresa foi acusada de praticar uma agressiva estratégia de expansão das plantações de eucaliptos na América do Sul. A British Petroleum, gigante petroleira apontada como responsável pelo maior desastre ecológico da história do Golfo do México, também patrocina a Amigos da Europa, embora ninguém tenha falado em seu nome durante a Semana.
Willy de Backer, porta-voz da Amigos da Europa, disse que sua organização criou um fórum conhecido como “Greening Europe” (Deixando a Europa Verde) para incentivar o debate sobre políticas ambientais. As corporações que se integram a esse fórum pagam uma taxa que varia de 35 mil euros (US$ 43 mil) a 50 mil euros (US$ 61 mil), explicou. A entidade não se dedica a proporcionar uma fachada verde, assegurou. “Não damos às companhias uma plataforma para exercer pressão”, afirmou. IPS/Envolverde
(IPS/Envolverde)
sábado, 5 de junho de 2010
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